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domingo, 4 de maio de 2014

Filosofia do Direito - Dos Gregos ao Pós-Modernismo - Wayne Morrison


O livro Filosofia do Direito - Dos Gregos ao Pós-Modernismo de Wayne Morrison consiste em uma estimulante ferramenta para quem busca uma introdução ao estudo da filosofia do direito. Diz respeito a contextualização de obras de diferentes autores normalmente estudados nos cursos de filosofia do direito. Portanto, é uma tentativa de oferecer um texto introdutório aqueles que pretendem aprender alguma coisa sobre a natureza da filosofia do direito, e que seja fiel a cronologia e ao inter-relacionamento dos escritos acadêmicos. A este propósito, parte dos objetivos do livro é de natureza exegética; fazendo uma exposição dos projetos materiais de diversos autores, apresentando-os dentro de uma certa contextualização. O livro trata de uma narrativa particular de Wayne Morrison em termos do pré-moderno, da modernidade e do início da pós-modernidade.
Inicialmente o leitor irá se deparar com o problema da filosofia do direito ou de dizer a verdade do direito, trata-se de entender a seguinte questão "o que é o direito?". A sequência do trabalho retoma as origens do direito desde a Grécia clássica, e a ideia do direito natural, passando pela narrativa de Platão e Aristóteles no contexto da filosofia clássica grega com o desenvolvimento da cidade-Estado, bem como a ética dos fins naturais.
O período da escolástica é refletido nas lições de Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino, ou seja, as leis da natureza, o poder do homem e Deus.
Com intento de abandonar a concepção religiosa do direito natural, seguindo a ordem cronológica do pensamento filosófico, Morrison nos apresenta Thomas Hobbes, que propõe uma solução para os problemas da condição natural: a criação de um soberano, um ser artificial, um deus mortal - o Leviatã. Neste capítulo o autor expõe as origens da teoria imperativa do direito na visão de Maquiavel, Francis Bacon, Descartes até o contratualista Thomas Hobbes.
A analítica empírica de David Hume, o defensor da experiência e da tradição contra as afirmações da razão como guia da modernidade, recebe linhas  expressivas, considerando o pensamento humiano acerca do argumento de se delimitar fatos e valores para se criar uma ideia de relações morais baseada em nosso conhecimento dos fatos reais da história natural e do funcionamento do mundo.
Kant via o empirismo de estilo humiano como um sistema correto sob muitos aspectos, porém o homem transcende sua natureza empírica e é capaz de um curso de ação regido pela razão prática, ou seja, é à luz da razão prática que temos sentimentos morais e elaboramos leis que tem, como seu pressuposto, o fato de que as pessoas não necessitam infringi-las. Para resumir as lições de Kant, sob a perspectiva de Morrison, a mensagem é simples: para nos tornarmos criaturas de paz, devemos primeiro nos colocar sob o domínio do direito.
O capítulo 7 do livro é dedicado ao romantismo ambíguo de Rousseau e a ideia expressiva do contrato social; e o sonho da eticidade do direito em Hegel.
O utilitarismo, o governo do ser humano pelos ditames do prazer e da dor, ou seja, a presença do primeiro e ausência do segundo, faz parte da análise em Adam Smith - e a justiça da mão oculta do mercado -, em Bentham - como a tentativa de criar uma ciência objetiva da sociedade e da política que fosse tão livre da subjetividade humana e livres das contingências da religião e do acidente histórico -, e em John Stuart Mill - que desenvolve o princípio de dano ou princípio de liberdade.
Contrário do que fez Hart, John Austin é bem acolhido por Wayne Morrison, para o autor, Austin criou a estrutura profissional do ensino da teoria jurídica em Londres, extraindo seus fundamentos das obras de Hobbes e Bentham. A filosofia jurídica pode desempenhar um papel único na educação social. O direito consiste em regras criadas para a orientação de um ser inteligente por um ser inteligente que terá poder sobre ele; é o conjunto das regras estabelecidas por dirigentes políticos. A ciência jurídica deve reconhecer o direito positivo, as regras criadas pela vontade política ou razão. Um comando é a expressão de um desejo, o significado de um desejo que se distingue pelo poder e pelo objetivo, por parte do grupo dominante, de infligir mal ou sofrimento se o desejo em questão for negligenciado. Por ser passível desse mal, a parte comandada é circunscrita ou obrigada pelo comando e colocada sob o dever de obedecê-lo.
A concepção marxista para o entendimento do direito e da sociedade trata de sua narrativa da história e a combinação entre teoria e prática - práxis. Para Morrison, Marx não construiu um corpus teórico específico sobre o direito. Os escritos de Marx e suas preocupações abarcaram uma gama de estudos intensos e produção intelectual. Talvez a leitura dominante tenha tendido a concentrar-se na estrutura determinista, materialista e teórica que tem a consequência de relegar o direito a um papel menos importante, como parte de uma superestrutura ideológica na qual tem por tarefa ajudar a manter as relações sociais que foram determinadas pelos fundamentos econômicos da sociedade (chamadas de "a base" em muitas análises). Para não estendermos muito o pensamento de Marx podemos dizer que a justiça do direito será sempre a justiça de classe.
Weber, Nietzsche, o Holocausto e a teoria pura do direito de Hans Kelsen foram abordadas no livro em uma narrativa descritiva do pensamento destes autores e dos acontecimentos que decorreram de seus estudos, como por exemplo, o anti-semitismo na Alemanha nazista.
O ponto alto do positivismo jurídico é o título do capítulo 13 que pode ser considerado como o ponto alto do livro de Wayne Morrison. Ao introduzir o pensamento de Herbert L. A. Hart acerca de sua teoria do direito como um sistema auto-referencial de regras a leitura passa por uma nova visão. A sociedade complexa é impossível sem instituições uniformes e profundas de socialização; contudo, o excesso de socialização voltado para a obediência pode produzir alguns dos grandes excessos da modernidade, os crimes de obediência. A criação de um povo moral é um processo ambíguo, pois a estrutura é sustentada pela socialização. A estrutura social são os feitos reiterados das pessoas; sem estrutura social não pode haver nem a vida cotidiana nem história social. A socialização, porém, também pode representar o despojamento do eu, do potencial para individualidade moral. A humanidade requer tanto a socialização quanto a socialidade contra-estrutura - ou o distanciamento crítico. A sociedade humana requer ambas as coisas, mas não se trata de uma combinação simples. A socialização pode desarmar a moralidade crítica, enquanto a sociabilidade contra-estrutural pode sobrecarregar o sujeito com a dúvida moral e a opressão existencial.
Wayne Morrison pela estrutura de sua linguagem pode ser considerado um liberalista. O autor dedicou um capítulo acerca do liberalismo e a ideia da sociedade justa na modernidade tardia com uma leitura de Kelsen, Rawls, Nozick e dos críticos comunitários com enfase em Michael Sandel que faz uma análise crítica das teorias liberais de justiça, seguindo com Charles Taylor que afirma a concepção liberal do sujeito como atomista porque afirma a natureza auto-suficiente do individuo, e Alasdair Macintyre como a tentativa de redescobrir a virtude.
Ronald Dworkin e a luta contra o desencanto: ou o direito na ética interpretativa da filosofia do direito liberal, onde chega-se a conclusão que sua obra, totalmente coerente, tem se ocupado com a natureza da interpretação judicial do direito e o papel do judiciário. Dworkin contribuiu para o direito no desenvolvimento de uma teoria consistente que permite ao juiz interpretar suas próprias responsabilidades morais e éticas de modo liberal. Desta feita, a interpretação tornou-se a nova metodologia da modernidade tardia.
O movimento dos estudos jurídicos críticos ou Critical Legal Studies teve seu início nos Estados Unidos no ano de 1977 onde os docentes das faculdades americanas aceitaram o convite para um congresso que havia uma ideia vaga: uma reunião de pessoas em busca de abordagens críticas do estudo do direito e da sociedade. A circular não continha quais as preocupações do congresso mas indicava que vários de seus autores estavam tentando desenvolver abordagens que enfatizassem o caráter ideológico da doutrina jurídica e de suas estruturas internas. Destaca nesta corrente de estudos o brasileiro Roberto Unger que foi citado várias vezes no livro de Morrison. Este movimento faz uma reflexão sobre a inocência, de caráter cético, com muita desconfiança "ao demonstrar que a vida social é muito menos estruturada e muito mais complexa, muito menos imparcial e muito mais irracional do que sugere o processo legal, os interesses atendidos pela doutrina e pela teoria jurídicas vão se tornar visíveis" (Roberto Unger).
Por fim Morrison analisa o direito feminista e as tentações da filosofia do direito na pós-modernidade.
Diante do breve relato da obra de Morrison o leitor poderá entender a evolução do pensamento filosófico jurídico desde os gregos até o pós-modernismo. Interessante que ao apresentar o ponto de vista desta diversidade intelectual, o leitor começa socrático, passa a ser contratualista em Hobbes, empirista em Hume, não se rende ao romantismo de Rousseau, torna-se um super-homem com vontade de potência em Nietzche, exegético em Dworkin, cético e desconfiado em Roberto Unger. Portanto, esta obra é indicada para todos os leitores do blog Jus Estudantes, principalmente para aqueles que iniciam o estudo de Filosofia Jurídica. Também é indicado para quem está se preparando para o exame da OAB auxiliando na resolução das questões de filosofia; e concursos públicos que exigem conhecimentos de filosofia e sociologia jurídica.

Referência Bibliográfica: Morrison, Wayne. Filosofia do direito: dos gregos ao pós-modernismo; tradução Jefferson Luiz Camargo. 2 ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2012

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